Requisitos de Informação na Construção Civil: Aplicabilidade Prática no Contexto BIM

Requisitos de Informação na Construção Civil: Aplicabilidade Prática no Contexto BIM

Introdução

Imagine estar no comando de um projeto milionário de infraestrutura, com prazos apertados, múltiplas disciplinas envolvidas e dezenas de decisões a serem tomadas diariamente. Agora, imagine tentar tomar essas decisões com base em dados incompletos, desencontrados ou desatualizados. Para muitos gestores de projetos na construção civil, essa é uma realidade constante: a ineficiência na troca de informações entre equipes é uma das principais causas de retrabalho, atrasos e custos não previstos.

Nesse contexto, o Building Information Modeling (BIM) surge como solução não apenas de modelagem tridimensional, mas como uma plataforma de integração e gestão de informação. No entanto, para que essa promessa se concretize, é imprescindível que as informações trocadas ao longo do ciclo de vida do projeto estejam estruturadas, organizadas e direcionadas aos objetivos reais do empreendimento.

É nesse ponto que entram os conceitos de PIR (Project Information Requirements), AIR (Asset Information Requirements) e LOIN (Level of Information Need). Este artigo apresenta de forma aplicada e fundamentada como esses conceitos se encaixam no fluxo BIM, ilustrando com exemplos práticos como sua implementação pode transformar a maneira como a informação é produzida, compartilhada e utilizada em projetos de construção. Para gestores de projetos, essa abordagem representa não apenas uma solução técnica, mas um caminho claro rumo à previsibilidade, à eficiência e ao controle pleno dos resultados esperados.

Fonte: CREA-SP

Conceito de Requisitos de Informação do Projeto (PIR)

Os Requisitos de Informação do Projeto (PIR) são definidos como as necessidades de informação durante a fase de projeto e construção de um empreendimento. De acordo com a ISO 19650-1 (2020), o PIR deve ser estruturado de modo a alinhar as expectativas do cliente com os entregáveis dos profissionais envolvidos no projeto. O PIR visa garantir que os modelos BIM contenham as informações certas, no momento certo, para apoiar a tomada de decisão.

Segundo EASTMAN et al. (2011), um dos maiores desafios do BIM é a definição clara de requisitos de informação para cada etapa do projeto. O PIR ajuda a mitigar este desafio por meio da formalização dessas necessidades.

Exemplo Prático:

Em um projeto de hospital, o cliente pode exigir que todas as portas automáticas sejam modeladas com informações detalhadas sobre acessibilidade, integração com sistemas de segurança e manutenção preventiva. O PIR, neste caso, definirá esses requisitos para que sejam considerados no modelo BIM desde o início da fase de projeto, usando ferramentas como Autodesk Revit e Archicad.

Requisitos de Informação do Ativo (AIR)

Os Requisitos de Informação do Ativo (AIR) têm como foco a fase de operação e manutenção do empreendimento. Conforme a ISO 19650-1, os AIR devem ser definidos pelo operador ou proprietário do ativo e devem guiar a coleta e a entrega de informações relevantes para a gestão eficiente do ativo após a conclusão da obra.

A norma britânica PAS 1192-3 (2014), predecessora da ISO 19650, enfatiza que os AIR devem permitir a continuidade da informação do projeto para o ciclo de vida do ativo, incluindo manutenção, substituição e operação.

Exemplo Prático:

No mesmo hospital, o AIR pode definir que todos os equipamentos mecânicos (HVAC, geradores, bombas) devem conter informações como datas de fabricação, vida útil, fornecedor, contratos de garantia e dados de manutenção. Essa informação pode ser organizada e integrada a softwares de gestão de ativos como Archibus ou Maximo, por meio do modelo BIM.

Requisitos de Informação de Troca (EIR)

O EIR (Exchange Information Requirements) é um documento que consolida os requisitos de informação tanto do projeto (PIR) quanto do ativo (AIR), sendo um instrumento essencial de comunicação entre o contratante e os fornecedores. Conforme a ISO 19650-1, o EIR deve ser preparado na fase inicial do projeto para guiar as entregas de informação ao longo de todo o ciclo de vida do ativo.

Fonte: SPBIM

O EIR atua como espinha dorsal para os processos BIM, definindo o que deve ser entregue, em qual formato, com que frequência e por quem.

Exemplo Prático:

Em um projeto de escola pública, o EIR pode exigir que os modelos BIM entregues em cada etapa estejam em formato IFC, contenham os parâmetros especificados para elementos críticos como sistemas de prevenção contra incêndios, e sejam revisados em reuniões quinzenais por todas as disciplinas. O EIR funciona como referência para que o Plano de Execução BIM (BEP) seja desenvolvido de forma alinhada com os objetivos do cliente.

Nível de Informação Necessário (LOIN)

O LOIN (Level of Information Need) é um conceito introduzido pela ISO 19650-2 (2018), substituindo a abordagem anterior centrada no LOD (Level of Development). O LOIN define o nível de informação exigido para cada elemento de informação, dividindo-o em três dimensões:

Geométrica: representação visual no modelo;

Alfanumérica: dados e propriedades do objeto;

Documental: arquivos e referências relacionadas ao objeto (manual, especificação, certificado, etc).

A União Europeia publicou o “Handbook for the introduction of Building Information Modelling by the European Public Sector” (EU BIM Task Group, 2017), destacando que o LOIN promove o uso racional de informações, evitando tanto a sobrecarga quanto a carência de dados.

Fonte: Catenda

Exemplo Prático:

Durante a fase de projeto de um edifício corporativo, uma luminária pode ter um LOIN baixo (representação geométrica genérica e poucos dados). Já na fase de detalhamento, a mesma luminária precisa atender a um LOIN mais alto, com geometria precisa, código de produto, potência, consumo, fabricante e manual de instalação.

Implementação dos Requisitos em uma Empresa da Construção Civil

Para aplicar PIR, AIR e LOIN de maneira eficiente, uma empresa pode seguir algumas etapas. Abaixo um checklist geral:

Definição de Objetivos de Informação

Com base nas necessidades do cliente, estruturar um Plano de Execução BIM (BEP).

  • Mapear entregáveis por etapa do ciclo de vida.

Desenvolvimento de Templates e Bibliotecas BIM

  • Criar famílias com atributos já definidos conforme AIR e PIR.

  • Estabelecer padronização de LOIN para cada fase (estudo preliminar, anteprojeto, executivo).

Integração entre plataformas

  • Uso de ferramentas como Solibri, BIMcollab ou Navisworks para verificação de requisitos.

  • Integração com CDE (Common Data Environment) como BIM 360, Trimble Connect ou Autodesk Construction Cloud (ACC) para centralizar e rastrear informações.

Treinamento e Governança da Informação

  • Capacitação da equipe nos conceitos da ISO 19650.

  • Nomeação de um coordenador de informações.

Desafios

Mudança de cultura organizacional: Equipes acostumadas a processos tradicionais tendem a resistir à adoção de novas metodologias baseadas em informação digital. Para mitigar esse desafio, é fundamental realizar treinamentos práticos, implementar pilotos e destacar resultados positivos.

Resistência à padronização: Projetistas e fornecedores muitas vezes preferem suas próprias formas de trabalho e modelagem, o que gera incoerência de dados. A ção recomendada é estabelecer diretrizes claras em um BEP (Plano de Execução BIM), validado em conjunto com as partes interessadas.

Integração entre softwares e formatos: A variedade de plataformas BIM pode causar dificuldades na troca de dados. Padronizar o uso de IFC (Industry Foundation Classes), promover revisões colaborativas com ferramentas de CDE e adotar workflows baseados em nuvem podem amenizar esse problema.

Vantagens

Redução de retrabalho: Com requisitos de informação bem definidos e integrados, evita-se a repetição de tarefas e correções de erros causados por dados mal interpretados ou ausentes. Isso se traduz em economia de tempo e recursos.

Tomada de decisão mais assertiva: A disponibilidade de informação confiável e estruturada em tempo real permite que gestores e projetistas tomem decisões fundamentadas, com menor margem de erro e maior previsibilidade dos impactos.

Manutenção preditiva eficiente: Ao atender aos AIR com dados completos sobre os ativos, a gestão de operação e manutenção pode ser feita de forma preditiva, reduzindo falhas, custos operacionais e aumentando a vida útil dos equipamentos e sistemas.

Conclusão

A aplicação dos conceitos de PIR, AIR, EIR e LOIN no processo BIM permite maior previsibilidade, segurança e organização na gestão da informação. Esses elementos são essenciais para garantir que todos os agentes envolvidos no ciclo de vida do empreendimento possam colaborar de forma eficiente. A clareza nas responsabilidades, bem como a padronização dos dados trocados, contribuem para a qualidade do produto final e para a sustentabilidade dos ativos ao longo de sua vida útil. A adoçção de um modelo colaborativo baseado em informação estruturada é, portanto, o caminho para uma construção civil mais integrada, eficiente e digitalizada.

AIR: Como Garantir um Modelo BIM Útil para Operação e Manutenção do Ativo

AIR: Como Garantir um Modelo BIM Útil para Operação e Manutenção do Ativo

Com a crescente adoção do BIM (Modelagem da Informação da Construção) em projetos de engenharia e arquitetura, garantir que os modelos gerados atendam às necessidades das fases posteriores à construção, como operação e manutenção, tornou-se um desafio crítico. O AIR (Asset Information Requirements ou Requisitos de Informação do Ativo) surge como um documento fundamental para assegurar que as informações certas estejam disponíveis no momento certo, contribuindo para a eficiência na gestão do ativo ao longo de seu ciclo de vida. Este artigo explora como o AIR pode ser aplicado de forma estratégica para tornar o modelo BIM um recurso verdadeiramente útil na fase de operação e manutenção.

Fonte: BibLus

O que é o AIR e qual seu papel no ciclo de vida do ativo?

O AIR é um documento que define quais informações são necessárias sobre um ativo para que ele possa ser gerenciado de forma eficaz após sua construção. Desenvolvido geralmente pelo proprietário ou operador do ativo, o AIR orienta os times de projeto e construção sobre o tipo, a qualidade e o formato dos dados que devem ser entregues ao final do projeto. Sua elaboração deve considerar os objetivos operacionais do ativo, integrando dados que serão usados por sistemas de gestão como CAFM (Computer-Aided Facility Management) ou CMMS (Computerized Maintenance Management System).

Um dos principais benefícios do AIR é permitir que o modelo BIM seja uma base de dados confiável, e não apenas uma representação visual do edifício. Isso significa que elementos como equipamentos, sistemas de HVAC, redes elétricas e hidráulicas precisam conter informações específicas de manutenção, manuais, garantias, datas de inspeção e vida útil. Sem um AIR bem estruturado, há risco de que o modelo BIM seja entregue com dados genéricos ou insuficientes para uso prático na operação.

Além disso, o AIR promove a padronização da informação entre diferentes projetos dentro de uma mesma organização, garantindo consistência ao longo do tempo. Isso facilita a integração com plataformas tecnológicas e o treinamento de equipes operacionais. Em grandes empreendimentos com múltiplos ativos, essa padronização é essencial para reduzir custos de operação e mitigar falhas de comunicação entre as áreas envolvidas na gestão predial.

Fonte: Instituto de Engenharia

Como integrar o AIR ao processo BIM desde o início?

Para que o AIR tenha real efetividade, ele deve ser integrado ainda nas fases iniciais do projeto, preferencialmente na etapa de planejamento e briefing do empreendimento. Isso permite que os projetistas e construtores compreendam desde o início quais dados são necessários, evitando retrabalhos e assegurando entregas coerentes com os objetivos do proprietário. A colaboração entre o time de Facilities Management e os profissionais de projeto é essencial nessa fase.

Essa integração antecipada também possibilita a definição de Modelos de Entrega de Informação (IDM) e planos de execução BIM (BEP), alinhados com os requisitos do AIR. Dessa forma, cada parte envolvida sabe exatamente qual é a sua responsabilidade quanto à inserção e validação de dados no modelo, promovendo transparência e rastreabilidade ao longo do processo.

Validação, entrega e uso do modelo BIM na operação

Ao final da obra, é fundamental que o modelo BIM passe por um processo rigoroso de validação para garantir que todas as informações previstas no AIR foram corretamente inseridas e estruturadas. Essa verificação deve considerar não apenas a presença dos dados, mas sua precisão e usabilidade. Ferramentas específicas de validação BIM podem ser utilizadas para automatizar parte desse processo e gerar relatórios objetivos.

Após a validação, o modelo BIM enriquecido com os dados definidos no AIR deve ser entregue em formatos compatíveis com os sistemas de operação do cliente. Além disso, é essencial capacitar a equipe de manutenção e operação para utilizar corretamente o modelo, garantindo que os benefícios planejados se concretizem na prática. Quando bem implementado, o AIR transforma o modelo BIM em um verdadeiro aliado da gestão eficiente dos ativos, reduzindo custos e otimizando recursos ao longo de todo o ciclo de vida.

Fonte: Novidá

Conclusão

A adoção do AIR como ferramenta estratégica dentro do processo BIM representa um passo essencial para garantir que os modelos digitais sejam verdadeiramente úteis na fase de operação e manutenção dos ativos. Mais do que uma exigência documental, o AIR deve ser entendido como um instrumento de gestão da informação que conecta o presente do projeto ao futuro da operação. Quando bem estruturado e integrado desde o início, ele assegura a entrega de um modelo BIM funcional, confiável e alinhado aos objetivos do proprietário, maximizando o valor do investimento em todo o ciclo de vida do empreendimento.